A dengue faz parte de um grupo de doenças denominadas arboviroses, que se caracterizam por serem causadas por vírus transmitidos por vetores artrópodes. No Brasil, o vetor da dengue é a fêmea do mosquito Aedes aegypti (significa “odioso do Egito). Os vírus dengue (DENV) estão classificados cientificamente na família Flaviviridae e no gênero Flavivirus. Até o momento são conhecidos quatro sorotipos – DENV-1, DENV-2, DENV-3 e DENV-4 –, que apresentam distintos materiais genéticos (genótipos) e linhagens.
As evidências apontam que o mosquito tenha vindo nos navios que partiam da África com escravos. No Brasil, a primeira epidemia documentada clínica e laboratorialmente ocorreu em 1981-1982, em Boa Vista (RR), causada pelos sorotipos 1 e 4. Após quatro anos, em 1986, ocorreram epidemias atingindo o estado do Rio de Janeiro e algumas capitais da região Nordeste. Desde então, a dengue vem ocorrendo de forma continuada (endêmica), intercalando-se com a ocorrência de epidemias, geralmente associadas à introdução de novos sorotipos em áreas indenes (sem transmissão) e/ou alteração do sorotipo predominante, acompanhando a expansão do mosquito vetor.
Aspectos como a urbanização, o crescimento desordenado da população, o saneamento básico deficitário e os fatores climáticos mantêm as condições favoráveis para a presença do vetor, com reflexos na dinâmica de transmissão desses arbovírus. A dengue possui padrão sazonal, com aumento do número de casos e o risco para epidemias, principalmente entre os meses de outubro de um ano a maio do ano seguinte.
Todas as faixas etárias são igualmente suscetíveis à doença, porém as pessoas mais velhas e aquelas que possuem doenças crônicas, como diabetes e hipertensão arterial, têm maior risco de evoluir para casos graves e outras complicações que podem levar à morte.
Com tendência de alta, as infecções e mortes por dengue registradas até agora indicam que 2024 corre o risco de se tornar o pior ano na série histórica da doença, superando o recorde registrado no ano passado. Até o início desta semana, o Brasil contabilizou mais de 345 mil casos suspeitos e ao menos 36 mortes — outras 234 estão sob investigação.
A epidemiologista Andrea Paula Von Zuben, da Unicamp, explicou ao Aos Fatos que, “para ser decretada uma epidemia nacional, todos os municípios do Brasil deveriam registrar alterações acima do esperado” — o que não é o caso atual.
A partir de estatísticas de incidência da dengue, o Ministério da Saúde monitora os casos e mortes em cada região do país e compara com os últimos 10 anos. Então, é calculado um limite endêmico considerado “esperado” ou “dentro da normalidade”. Se esse limite for superado, aí, sim, o cenário pode ser considerado “epidêmico”
POR QUE O CENÁRIO ATUAL NÃO É DE “EPIDEMIA NACIONAL”?
Por que o cenários atual não é de “Epidemia Nacional”?
Von Zuben, da Unicamp, explica que o conceito de epidemia nacional dificilmente enquadraria a dengue por se tratar de uma doença vetorial — ou seja, transmitida por meio de um vetor, no caso, o mosquito Aedes aegypti. Dessa forma, o aumento dos casos é atrelado às características regionais, como proliferação do inseto, afetada principalmente pelo clima e pela quantidade de água parada no local, e número de pessoas suscetíveis à infecção.
Já uma Esin (Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional) é declarada pelo Ministério da Saúde quando determinada doença apresenta algumas das seguintes condições:
- Há risco de disseminação nacional. Esse critério não se aplica à dengue porque ela não é uma doença de transmissão de pessoa para pessoa;
- A doença é causada por agentes infecciosos inesperados. Esse critério não se aplica porque o Brasil registra casos de dengue há décadas;
- Trata-se de reintrodução de uma doença erradicada. Esse critério também não se aplica à dengue, que nunca foi extinta;
- A doença apresenta gravidade elevada. Esse critério não se aplica porque a mortalidade da dengue é baixa;
- Ou o surto extrapola a capacidade de resposta das direções estaduais do SUS (Sistema Único de Saúde). Esse critério se aplicaria, mas não há sinais de sobrecarga nos estados.
Quais Estados já Declararam Situação de Emergência?
- Quatro unidades da federação já decretaram situação de emergência: Acre, Minas Gerais, Goiás e Distrito Federal. A cidade do Rio de Janeiro também emitiu declaração de emergência.
- A maior parte dos casos registrados até agora foi nas regiões Centro-Oeste, Sudeste e Sul (veja gráfico abaixo). Até o momento, Minas Gerais é o estado com o maior número de notificações (foram 112 mil até o dia 5 de fevereiro), seguido de São Paulo (56 mil casos suspeitos) e Distrito Federal (45 mil casos suspeitos).
O que Mostra a Série Histórica de Estatísticas?
A dengue é considerada um problema de saúde pública no Brasil há anos. O número de casos tem aumentado de modo significativo na última década (veja abaixo). Em 2023, foram registrados 1.658.816 casos em todo o país, o maior número da série histórica, iniciada em 2000.
A série também mostra dezenas de mortes pela infecção todos os anos. No ano passado, o Brasil bateu o recorde histórico de mortes causadas pela dengue: foram 1.094, número levemente superior ao maior registro anterior, 1.053 óbitos em 2022.
Quais Medidas o Ministério da Saúde Anunciou até Agora?
A pasta comanda a campanha “Brasil Unido contra a Dengue”, lançada em maio do ano passado, para conscientizar a população sobre os sintomas da doença e as medidas para combater a proliferação do mosquito. O governo federal também adquiriu vacinas contra a infecção, que serão administradas na rede do SUS para crianças e adolescentes das regiões com maior incidência da dengue.
O que é a vacina da dengue (QDENGA®)?
A QDENGA® é uma vacina atenuada contra a dengue que protege as pessoas da ação de quatro sorotipos do vírus: DEN-1, DEN-2, DEN-3 e DEN-4. Desenvolvida pela farmacêutica Takeda, ela pode ser aplicada em pessoas com idade entre 4 e 60 anos.
O esquema completo da Qdenga é composto por duas doses, a serem administradas por via subcutânea com intervalo de 3 meses entre elas. Quem já teve dengue também deve tomar a dose.
Dentro do Plano Nacional de Imunizações a vacina será oferecida no SUS por enquanto apenas para crianças e adolescentes de 10 e 11 anos em regiões pré-definidas.